No último post que publiquei aqui no blog sobre ‘Por que as escolas de artes não falam sobre empreendedorismo para os artistas?’, eu até levantei uma questão – que também cabe neste próximo assunto – sobre a sazonalidade das ofertas de trabalho. Isso, claro, levando em consideração a fatia do mercado artístico que eu domino: Teatro (Musical). Mas essa realidade também se aplica para o audiovisual, para a dublagem, para o teatro independente, para o mercado de eventos…
Existe aquela máxima que “de grão em grão, a galinha enche o papo”, né?! E foi assim que vivi os últimos 11 anos da minha vida. Se não estava em cartaz em algum musical, estava dando aula de teatro, me enfiando em algum evento para cantar ou, é claro, ralando para tirar meus projetos do papel.
NÃO POSSO RECLAMAR. Sou muito grato por todas essas experiências que me trouxeram até aqui. Há quem diga que eu sou um privilegiado, por ter conseguido me sustentar até agora só fazendo o que eu amo. Só que é fácil dizer isso quando não se vê os bastidores, cheios de altos e baixos, incertezas, medos, os meses em que não aparecia um job sequer, as noites angustiantes, a conta zerando e ficando vermelha…
Esse jogo de cintura de nós, artistas, é realmente invejável. Vivemos um incansável treinamento de resiliência e resistência. Mas, sinceramente, o quanto essa estrutura (de jobs picados, ganhando um tiquinho em cada lugar ou ganhando montantes por temporada) é viável no longo prazo?!
É claro que se alguém me fizesse essa pergunta há 11 anos atrás, diria que isso não importava. Naquela época, eu não tinha em mente que as contas sofrem reajustes de ano em ano (principalmente a fatura do convênio médico, que à medida em que se fica mais velho, fica mais cara), que por ter uma profissão 100% autônoma, eu teria que aprender a gerenciar com mais cuidado o meu dinheiro, que não há regulamentação nenhuma sobre os trabalhos de artes que garanta um piso do quanto eu tenho que ganhar em um trabalho e que “viver do que ama” tem sim seus ônus e bônus e eles precisam ser avaliados em um contexto de vida mais amplo.
Fazer o que se ama é bom demais! E eu, pessoalmente, sou perdidamente apaixonado pela minha profissão. Mas tenho percebido cada vez mais a importância de uma boa gestão de carreira nas artes. Apesar de amar o que eu faço, eu quero sim adquirir uma vida em que eu tenha condições de viajar, fazer cursos, ter um ano sabático, adquirir alguns bens… São todas realizações pessoais que condizem com o estilo de vida que eu quero ter.
Talvez você não queira nenhuma das coisas que mencionei ali em cima, mas com certeza você tem sonhos que deseja realizar, certo?! De todo modo, não te incomoda “trabalhar para sobreviver”? Porque se você for botar na ponta do lápis, o que se ganha em uma temporada média de teatro (2 meses de ensaio + 3 meses em cartaz) não garante o seu sustento de 1 ano. Daí, você precisa fazer uns bicos pra fechar a conta ou ter o privilégio de emendar uma produção na outra (e ainda assim, talvez a conta não feche).
Eu sei que o perfil do artista não é pensar estrategicamente a sua vida, como definir a sua “aposentadoria”, por exemplo. Provavelmente você se veja nos palcos até ficar bem velhinho, honrando o ofício até o fim dos seus tempos nessa existência. E isso é lindo! Eu mesmo me imagino assim. Outro dia fui assistir uma montagem do Romeu e Julieta com o Renato Borghi e a Miriam Mehler (ambos atores com 80 anos interpretando o casal título) que foi uma das coisas mais lindas e poéticas que assisti nos últimos tempos! É lindo demais ver a maturidade em cena!
So que não preciso me alongar muito lembrando que com a maturidade, surgem responsabilidades e necessidades que, quando jovens, não existiam. E isso pensando puramente pelo prisma prático da vida. Mas e enquanto há juventude para conhecer o mundo, explorar culturas diferentes, ir a um restaurante bacana sem peso na consciência, poder investir em um projeto pessoal que cala no seu coração sem colocar nele o peso do “tem que virar senão não tenho o que comer”? Onde tudo isso fica hoje no seu contexto de vida atual, na sua carreira como artista?
Não estou falando de luxo, tá?! Estou falando de experiências que fazem essa vida valer a pena ser vivida. Tente agora analisar o que eu estou dizendo pela sua ótica: O que é importante pra você?! O que você ainda quer realizar?! Como você quer estar daqui 10 anos?! Como você vislumbra a sua jornada profissional?!
Vamos então fazer um diagnóstico pensando na longevidade da sua carreira?!
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01. Onde você está na sua Pirâmide da Carreira Sustentável?
Nos últimos anos, mais precisamente desde 2014, eu tenho me empenhado bastante para entender o que falta para que o mercado artístico se torne um mercado sustentável. Quanto mais eu estudo, mais eu percebo que o buraco é mais embaixo, rsrsrs…
Mas dentre as sacadas que eu tive, essa a seguir eu tenho usado bastante, principalmente nos meus atendimentos individuais para artistas. Chamei de “Pirâmide da Carreira Sustentável”.
O artista ativa o B2C (Business to Consumer) quando vende seus produtos e serviços (seus tickets, suas músicas, seus conteúdos…) diretamente para o consumidor fim, ou seja, para a sua audiência (fãs, alunos, público em geral…).
Já o B2B (Business to Business) é ativado quando o artista presta algum serviço para alguma empresa (muito comum quando se faz algum evento, quando participa de alguma campanha publicitária, quando se trabalha com dublagem, quando se dá aula em alguma escola de artes…).
E o B2A é quando o artista participa de processos seletivos para conseguir o job (as famigeradas – por vezes temidas – audições. Muito comuns em musicais e nos projetos de audiovisual como filmes, séries, novelas…). Também podemos colocar no B2A todos os projetos que esperam por um edital, leis de incentivo à cultura e patrocínios. Na verdade, o B2A é uma variação do B2B, mas vou falar disso mais pra frente.
O artista que está com a sua pirâmide no modo sustentável, consegue ter como base o B2C, ou seja, a maior fatia da renda dele vêm da relação que ele tem diretamente com o seu público. Logo depois, consegue uma grana com parcerias e permutas com empresas e marcas (B2B) e, lá no topo fica o B2A.
O que difere cada uma dessas 3 variações é a quantidade de intermediários.
No B2C, como a renda vem diretamente com o público final, não há nenhum intermediário. Você oferece algo para a sua galera e essas pessoas compram de você. É pá-pum.
No B2B, a empresa que te contrata intermedia os seus serviços para a base de clientes, colaboradores e funcionários dela.
E no B2A, a parada é mais complexa: você só será contratado caso você tenha os pré-requisitos para integrar aquele projeto, que vai além das suas habilidades como artista (porque tem a questão do perfil e de mais um tanto de outras variantes). Ou seja, existe uma cadeia de intermediários para que você de fato usufrua desse ativo.
Logo, o que eu estou querendo te mostrar é que quanto mais intermediários existem entre você e aonde você quer atuar, menos sustentável é a sua carreira!
Vale aqui uma ressalva: Você não precisa ser mega famoso pra ser um artista que usufrui de uma carreira sustentável. Principalmente nos dias de hoje, em meio a tantas oportunidades que a internet te dá para expor suas ideias e projetos.
De acordo com o Kevin Kelly, um renomado marketeiro americano, existe um meio termo entre o estrelato e a obscuridade. Ele diz que para uma carreira ser efetivamente sustentável, a pessoa precisaria angariar não mais do que 1.000 fãs verdadeiros. E o que ele quer dizer com isso?! Cata só:
Um criador como um artista, músico, fotógrafo, ator, animador, designer, designer de jogos, editor de vídeos ou autor – ou em outras palavras, qualquer pessoa que estiver produzindo alguma forma de arte – precisa adquirir somente cerca de 1.000 Fãs Verdadeiros para conseguir (sobre)viver do seu trabalho.
Um fã verdadeiro é definido como alguém que irá comprar basicamente tudo o que você produzir. Eles vão dirigir mais de 300 quilômetros só para ver você cantar. Eles vão comprar a versão hiper deluxe remasterizada de algum produto seu … mesmo que eles já tenham a versão de baixa resolução. Eles vão colocar um Google Alerta com o seu nome. Eles vão salvar uma página de vendas no eBay com a esperança de conseguir aquele seu produto que já saiu de linha 7 anos atrás. Eles irão aos eventos que você participar. Eles vão querer seu autógrafo. Eles vão comprar a sua camiseta, e a caneca, e o boné personalizado. Eles vão quase morrer de ansiedade somente esperando pelo seu próximo trabalho. Eles são os seus verdadeiros fãs.
1.000 Fãs Verdadeiros é um número aceitável. Você conseguiria facilmente contar até 1.000. Se você, por exemplo, conseguir um Fã Verdadeiro por dia, demoraria somente 3 anos para alcançar seu objetivo. Construir sua base de Fãs Verdadeiros é com certeza alcançável. Agradar um fã verdadeiro é agradável e inspirador. Isto recompensa o artista de tal maneira a se manter verdadeiro com ele mesmo e com os aspectos únicos do seu trabalho, qualidades que Fãs Verdadeiros apreciam.
Agora é só fazer uma continha rápida: Se cada um dos 1.000 fãs verdadeiros que você consquistar te pagasse recorrentemente R$10 por mês, você já teria um ativo fixo de R$ 10.000! Nada mal, não?!
Só que criar uma base de 1.000 fãs verdadeiros não é tão simples quanto ter 10k seguidores no instagram. O que nos leva ao segundo tópico do diagnóstico:
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02. Como está o seu posicionamento?
Há de se convir que ainda existe uma certa resistência entre os artistas sobre esse tópico, como se desenvolver o seu Posicionamento fosse cafona ou um artigo de luxo exclusivo para os artistas famosos.
Então vamos desmistificar logo: Posicionamento é como você se coloca de forma autêntica para o mundo. Não tem a ver necessariamente com marketing, com “se vender” ou com a quantidade de seguidores que você tem. Claro que quando se tem um posicionamento claro, fica mais fácil você ganhar dinheiro com as suas habilidades e paixões, mas posicionamento é uma coisa, marketing é outra, venda / oferta é outra.
Hoje em dia quase todo mundo está na internet e a maioria participa das redes sociais. Cada vez mais produzimos informação, conteúdo e ambientes virtuais de interação. Nunca na história da humanidade se viu tantas conexões, diálogos e opiniões emergindo. Os pessimistas dirão que esse é o fim dos tempos, que a internet é terra de ninguém e que o pior do ser humano foi revelado com tanta liberdade de expressão.
Sim, o lado obscuro da internet é bem presente nas redes (vide os hatters e as fake news), mas pra mim esse é só um efeito colateral de algo que estava reprimido. Por isso que hoje a melhor forma de se melhorar a qualidade do que rola na internet é se posicionando com muita clareza e autenticidade.
Mas você também pode pensar, sim, no seu posicionamento de forma estratégica, visando a sua carreira e os seus objetivos profissionais. WHY NOT? Antes, para se alcançar muitas pessoas, você precisava ter muita grana para ser visto em horário nobre na tv. Hoje, qualquer um pode se posicionar e criar sua própria comunidade de fãs (e lembra que lá em cima eu te contei que você não precisa de muito mais que 1.000?)
Um dos benefícios da internet foi o de democratizar a informação e o como você alcança as pessoas. Tá acessível pra qualquer um! E você pode aproveitar dessa facilidade para atingir as pessoas certas que possivelmente se identifiquem com aquilo que você faz. O primeiro passo é começar.
Além do trivial da sua vida e do quanto você quer de fato se expor para os outros, que tipos de conteúdos fazem sentido você compartilhar?! Quais conteúdos você poderia desenvolver para melhorar sua visibilidade? Quais bandeiras você quer levantar? Que tipo de pessoa você quer que consuma o seu conteúdo?!
Agora, mesmo você não querendo fazer um posicionamento estratégico e desenvolver um marketing de conteúdo, lembre-se que você é o seu próprio produto e serviço! Se você não se posiciona bem, como é que as pessoas vão saber o que você faz?! E se tudo isso que eu te disse ainda não for o suficiente para te instigar a usar estrategicamente o seu posicionamento, pelo menos se posicione melhor para melhorar a qualidade do que rola nas redes. Essa já é uma ótima contribuição social.
DICA: Se quer entender mais sobre como desenvolver um bom posicionamento com base na sua autenticidade, talentos e paixões, leia “Tribos” do Seth Godin.
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03. Quanto você poupa do dinheiro que você ganha?
Mais um item que por muito tempo eu achei que fosse uma grande besteira. Quando comecei essa jornada de “empreender através do autoconhecimento”, eu achava que poupar era algo retrógrado, uma atividade que já não condizia mais com o novo mundo que está surgindo.
Me colocava embaixo do discurso que queria “gastar somente com o que eu ganhasse” e que isso bastava. Pra que poupar se poderia pegar o que ganho e viver plenamente o agora?!
Só que com esse pensamento, eu deixei de colocar meus sonhos mais ousados pra jogo. Assumi um certo conformismo, que muito rápido começou a me consumir. Porque seguindo esse pensamento, jamais conseguiria nessa vida fazer um ano sabático – ganhando o meu salário de 4 anos atrás – e isso me frustrava!
Talvez essa seja uma ideologia linda para aqueles que procuram uma vida mais frugal, mais pacata… Mas não é esse o sentido de liberdade que eu quero pra mim, e não acho que isso se aplique no real contexto do mundo. Há de se ponderar, claro. Viver para poupar realmente não faz o menor sentido, porque te faz postergar a vida. Mas não é esse o sentido de poupar que adquiri pra mim.
Estou vendo no ato de poupar (que, diga-se de passagem, estou começando só agora com a ajuda de uma consultora financeira do amorsh) a forma de trabalhar a minha paciência, a minha disciplina e a minha ansiedade. Gosto de pensar na ideia de ver o dinheiro render pra mim, a cada novo passo que dou. Ao contrário do que um dia ouvi, que investir dinheiro é estancar a abundância, percebo que existem diversas formas de se aplicar a minha grana, e não preciso colocá-la a serviço de empresas que não condizem com os meus princípios, se eu não quiser. Tudo é uma questão de achar o meio termo, e acho que o ranço quanto a poupar está na falta de conhecimento sobre educação financeira.
O fato é que o dinheiro que eu ganho, se bem gerenciado, pode não só garantir o meu sustento no presente, mas também financiar aqueles sonhos que ainda quero realizar um dia, e que no momento não é possível. E eu incentivo fortemente a você, artista, a fazer o mesmo. Porque fazer arte é caro e o retorno nem sempre é proporcional ao seu investimento (pelo menos não ainda). Então que uma parte da grana que você ganha hoje seja capaz de patrocinar aquilo que você quer fazer para o resto da vida. Pense nisso e procure ajuda com especialistas no assunto.
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04. Quanto custa o seu serviço?
Outra grande falha. O artista tem muita dificuldade de precificar os seus serviços. Sofro isso na pele até hoje. É sempre incômodo. E negociar contrato então?! Meu Deus, que suador!
Nesse sentido, não conheço uma regra fixa. Há quem diga que você deva precificar por hora. Outros dizem que você precisa incluir tudo o que já investiu de conhecimentos até hoje. Outros vão te dizer que você precisa se adequar às práticas do mercado… Enfim, existem uma infinidade de possibilidades sobre esse assunto.
Eu sinceramente não sou a pessoa mais indicada para te dar qualquer tipo de conselho quanto a isso, porque eu, honestamente, não sei fazer isso direito ainda, haha… Mas mesmo assim quis levantar esse tópico porque tenho plena consciência de que isso é uma falha não só na minha carreira como na carreira de muitos outros artistas.
Nós precisamos saber o nosso valor! Se a gente não se valoriza, quem é vai?!
A nossa relação com o dinheiro é realmente péssima. Precisamos mudar isso. É por isso que me comprometo a trazer uma especialista neste assunto para conversar com a gente e desmistificar o mundo financeiro. AGUARDEM!
Quem vive de arte, ou tem o sonho de criar uma carreira artística, possivelmente já se deparou com uma realidade que nem sempre é das mais atrativas no quesito financeiro. Convenhamos que, de fato, o mercado artístico é sim bastante volátil.
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